Denúncia contra militar por crime na ditadura deve chegar ao STF, diz PGR
MP apresentou denúncia contra militar por crimes na guerrilha do Araguaia.
Para o procurador-geral, trata-se de ‘uma questão jurídica nova’.
Débora Santos, do G1, em Brasília
O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, afirmou nesta quarta-feira (14) que o Supremo Tribunal Federal (STF) pode voltar a discutir a anistia a militares que cometeram crimes no período da ditadura (1964-1985) diante da denúncia contra o coronel da reserva Sebastião Curió Rodrigues de Moura.
Conhecido como major Curió ele deve responder por crimes de sequestro qualificado contra cinco militantes que atuaram durante a guerrilha do Araguaia. A ação foi ajuizada nesta quarta pelo Ministério Público na Justiça Federal em Marabá.
A guerrilha foi um movimento armado contra a ditadura militar organizado pelo PC do B e reprimido pelo Exército, entre 1972 e 1975, no sul do Pará. Nesta quarta-feira, procuradores da República encaminharam à Justiça Federal do Pará denúncia contra o militar pelo crime de sequestro.
Segundo os procuradores, esse tipo de crime é permanente e, por isso, não poderia se encaixar na Lei de Anistia, que livrou de punição representantes do Estado (policiais e militares) que praticaram atos de tortura durante o regime militar (1964-1985).
“A minha posição quanto à Lei da Anistia é aquela do parecer que ofereci no STF, de que os fatos estão cobertos pela anistia. [Os procuradores] sustentam uma tese diferente. Como os crimes estariam em andamento não teria aplicação a Lei da Anistia. É uma questão jurídica nova que terá que ser examinada e acredito que chegará ao Supremo”, disse o procurador-geral, se referindo ao julgamento no STF que manteve a anistia aos militares.
A dúvida em relação à aplicação da anistia no caso do Major Curió é motivo suficiente para que a defesa recorra ao STF para contestar a denúncia feita à Justiça do Pará. O advogado do coronel, Adelino Tucunduva, afirmou que não pode ainda falar sobre a estratégia de atuação da defesa, mas avaliou a tese do MP como “equivocada”.
A defesa de Curió afirmou que não iria se manifestar até ser notificada, o que pode ocorrer em até 40 dias. “É uma bobagem isso aí e não estamos preocupados”, afirmou o advogado Adelino Tucunduva ao G1 nesta quarta.
Contraditório
Apesar de mantida a anistia aos militares, em dois julgamentos, em 2009 e 2011, a maioria dos ministros do STF entendeu que o sequestro é um crime permanente e, portanto, não corre o risco de prescrever.
Um exemplo é o julgamento do pedido de extradição do major do exército argentino Norberto Raul Tozzo, suspeito de participação no “Massacre de Margarita Belén”, durante o regime militar argentino.
Na ocasião, o ministro Marco Aurélio foi contra a extraditar o militar para que fosse julgado em seu país pelo crime de sequestro. Segundo o ministro, permitir o julgamento do major argentino seria o mesmo que julgar responsáveis por crimes semelhantes ocorridos no Brasil, onde isso é vedado pela Lei de Anistia.
Nesta quarta, a ministra-chefe da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência, Maria do Rosário, afirmou que o Ministério Público Federal “está cumprindo seu papel” ao formular denúncia contra o coronel. “Isso em nada tira nosso objetivo de levarmos adiante nosso trabalho que estamos desenvolvendo de nossa história ser resgatada no Brasil”.